Ana Alvarenga e Ralf Côrtes foram do Rio até a Bahia para o VIII° Encontro de Escaladores do Nordeste, que aconteceu de 9 a 12 de outubro deste ano em Itatim, e escrevem o relato deste incrível lugar:
“O SUL VAI AO NORTE
Dia 8 de outubro de 2009, 22 horas de viagem desde o Taquaril, Petrópolis-RJ até Itatim-BA numa tirada só, parando para os cafés e rangos, na fiat doblô do Eliseu Frechou (que tinha vindo de São Bento do Sapucaí-SP uns dias antes), chegando no destino final no dia anterior do início do evento mais esperado do ano no Nordeste, o VIII° Encontro de Escaladores do Nordeste. Dormimos na Pousada Ponta Aguda, bastante recomendável (confortável e barata).
Oito da manhã, Valtinho da organização nos acorda para conhecer o espaço do evento, uma escolinha municipal colorida e simpática, onde os escaladores ficariam alojados e onde comeríamos. Demos um rolé com a galera de Feira de Santana, maiores freqüentadores do lugar, para conhecer todos os setores daquele complexo de morros de granito que cercam a cidade de Itatim, encravada na caatinga baiana: Toca, Enxadão, Napoleão. Vimos o Dago Ivan passando veneno na “Antibiótica”, maior via da localidade, com 360m de VII E3 D3, no Morro do Enxadão. Depois do almoço delicioso oferecido para os inscritos no evento, começamos a brincadeira no Setor Toca, mais próximo da cidade, agradável e arborizado, que abriga duas grandes cavernas muito impressionantes. Fizemos, eu, Ralf e Eliseu, duas vias esportivas interessantes e curtas, com 10 costuras no máximo, “Caatingueira” 6ºsup e “Angaroba” 7A, e o Ralf ainda tentou a “Lágrimas de Tatuarana” 8C. Durante esta tarde já tinha dado pra perceber a boa qualidade das escaladas locais, com agarras sólidas e lances fortes e técnicos. À noite, foi servido um jantar não menos apreciável, o que se repetiria nos próximos dias. Apresentações no palco, palmas para Dona Mariquinha, proprietária do Setor Toca, bonita senhora da terra, muito pro-ativa com relação aos montanhistas, pessoa agradável e receptiva, importantíssima para o desenvolvimento da escalada-em-rocha na cidade, juntamente com a Prefeitura, que patrocinou todo o evento realizado pelo Kaaporas Clube de Aventura e pelo Clube Baiano de Montanhismo. Mais uma vez vemos os esportistas brasileiros se virando sem um mínimo de apoio das marcas nacionais. Assistimos a pelo menos 20 voluntários ralando durante os 4 dias do evento, sem contar os preparos. Rolé na cidade, festa na praça e cama.
Manhã de sábado, mais descansados, fomos pra face sul da Toca, onde há 3 vias num negativo de 30m. Entramos nas “Alzheimer” 7B e “A.V.C.” 8C, ambas de resistência com agarras grandes e sólidas. Depois do almoço, fomos assistir ao desafio proposto pela organização, um pequeno campeonato de vias à vista, onde escaladores adolescentes deram um show guiando sétimos graus! Na sequência, fomos para o Napoleão, onde o Ralf passou à vista delirando numa via alucinante, a “Jesus que calor” 7C 27m. Banho, jantar e axé na praça… chuva, pra alegria do povo local! A idéia de entrar na “Antibiótica” dia seguinte foi minada porque tinha que ser muito cedo (tinham várias cordadas agendadas) e a parede estaria molhada.
Resolvemos, então, investir em novo setor no domingo com o Eliseu e o Valtinho. Abrimos 3 vias maneiríssimas, estéticas, negativas, “Costela no Bafo” 6ºsup, “À espera do forró” 7A e “Aqui se faz, aqui se paga” 8C, sendo esta última o filé com 6 costuras, encadenada por Ralf e Eliseu. À noite, palestra deste último, discurso da Vice-Prefeita da cidade, dos organizadores e de representantes dos Estados presentes (BA,PE, PB, RN), entrega de prêmios, slack line, tecido , exibição de filmes da Chapada Diamantina por Henrique Gironha e anúncio do próximo encontro em novembro de 2010 em Pernambuco (Brejo da Madre de Deus).
Último dia (infelizmente), acordamos cedo e enfrentamos algumas esportivas no Setor Enxadão, o mais sombreado, perfeito para o dia que foi o mais quente de todos. Fomos com a Luan, forte escaladora baiana que desenvolve, junto com o Gironha e a galera de Lençóis, escaladas de alto nível na Chapada Diamantina. Ralf mandou duas vias à vista, “Graxeira” 8A e “Pata choca” 7B, enquanto eu fiz a primeira de flash com uma queda… vendo a possibilidade da cadena, tentei mais uma vez já com o Eliseu apressando nossa saída, mas errei uma agarra depois do crux e minei minhas forças… ficou pra próxima. Luan trabalhou as duas vias e, segundo relatos, a baianinha foi lá no dia seguinte e encadenou ambas! Despedidas no almoço e longa viagem de volta ao som da música eletrônica do piton head, desejando retornar em breve para fazer o cume do Morro do Enxadão e resolver as cadenas pendentes. Muitos parabéns aos conquistadores e organizadores: Otto, Marcinha, Paulinho, Valtinho, Raimundo, Lu, Alessandro, Elder, Anna Paula, Eduardo, Dany, Leo, Chico Rio etc.
Dia 12 das crianças, longo retorno…
O nordeste brasileiro por inteiro tem um maravilhoso potencial de escalada, sendo que a cada ano um novo pico é descoberto, o que proporciona a evolução da escalada nesta região e o aumento do número de praticantes. Alguns lugares com sombra e água fresca e outros em condições áridas, oferecendo novos desafios também ao restante dos escaladores do país. Desde o primeiro encontro, o número de inscritos no Encontro do Nordeste subiu de uma rodinha de amigos para 150 pessoas, sendo apenas uma amostra de toda a região, já que as distâncias são longas e nem todos podem participar. Neste último, nós éramos os três únicos representantes do “Sul” (como diziam alguns). Como o desenvolvimento do esporte lá é recente, percebemos uma visão diferenciada dos escaladores daquelas paragens, muito mais respeitadores diante do ambiente que lhes oferece lazer e esporte e diante das pessoas que os cercam. Mais uma vez (depois de Pedra da Boca-PB, Rio de Contas-BA e Serra Caiada-RN) confirmamos a boa educação e receptividade da galera do nordeste, o que nos deixa esperançosos com relação à verdadeira evolução do esporte no Brasil, já que também observamos os altos níveis alcançados por esses escaladores, diferentemente do que a maioria da galera do “Sul” pensa. Convidamos, então, os experientes escaladores “sulistas” a conhecer, respeitosamente (claro!), os incríveis picos nordestinos… nós temos muito a aprender por ali…
Só em Itatim, há mais de 60 vias para deleite de escaladores, fora as possibilidades de bolder…
Ana Alvarenga“
Abraços da Yuri!